27.8.11

Retomando estrada

Nenhum homem é homem sem a alma a animar-lhe o corpo, como fogo que seja a causa do fumo. Nenhuma alma sobrevive sem alimento, nenhum outro alimento nutre e fortalece salvo o da filosofia. Nenhum homem é vivo sem ser da Natureza uma parte, nenhum ser existe fora da sua Pátria, nenhuma alma filosófica me preexiste que não possa ser a da filosofia da terra portuguesa. Foi por ela que cheguei aqui, folheando em arroubos Leonardo Coimbra, tacteando, pedagógico, Álvaro Ribeiro, dispersando-me por Pinharanda Gomes e sistematizando-me em António Quadros. Depois foram todos os outros, coleccionando angústias com o Fidelino Figueiredo, passeando, incerto, com o Agostinho da Silva e tantos e tantos mais: Orlando Vitorino, José Marinho, Fernando Pessoa... Não quero mencionar mais nomes porque não quero esquecer-me de nenhum nome, nem quero que se note que me falta conhecer tantos nomes. 
Esta manhã reencontrei a Nova Águia e dei conta que há vários números que a perdi. E a partir dela fui a esta obra de amorosa dedicação, uma bibliografia para quem quiser iniciar-se e complementar-se. E senti, como um pulsar cardíaco, vontade de seguir em frente pela longa caminhada, retomando estrada.
Acordei, pois, de uma longa sonolência, a força da luz a iluminar-me a existência.

9.8.11

O mundo e os seus intérpretes

A ideia recolhia-a numa entrevista que a Maria Filomena Molder deu à revista Ler. A conversa não saiu fluente e a própria pergunta-se quanto a terem sido, entrevistadora e entrevistada, demasiado abstractas. Há, porém, um momento em que um princípio é ilustrado por um exemplo. E embora a exemplificação não seja a mais digna forma de enunciar uma ideia ou de a demonstrar no caso a sua força ilustrativa ganha corpo.
Trata-se das declarações que são, logo que proferidas, comentadas imediatamente pelo entrevistador, o que é o caso das afirmações oriundas do território da política. O efeito do fenómeno é a anulação da distância e a geração da instantaneidade do efeito. O destinatário do dito nunca a chega a ter intervalo para meditar no ouvido e para formar uma opinião sobre o escutado pois logo o comentador surge a apontar como um sinaleiro o sentido único da interpretação e o desvalor de interpretações em contrário.
Claro que como há, e a tanto alude também a entrevistada, "comentadores de comentadores" o mundo resolve-se entre os seus intérpretes.